“É uma imagem que nos machuca, mas que não pode nos deixar só no luto. Precisamos que situações como estas nos deem força pra lutar e para que elas não se repitam”.

“Por uma cidade acolhedora: somos todos migrantes”.

 Aylan Kurdi, menino sírio de 3 anos encontrado morto em praia da Turquia, em 2015, e que se tornou símbolo da crise migratória mundial, é o elemento central do Painel do Curso de Verão 2019, assinado pelo artista popular brasileiro Guto Godoy.
O autor, que atualmente cursa arte em Roma, na Itália, afirma que procurou fazer uma síntese dos processos migratórios da atualidade, mas sem esquecer os anteriores.
Ressignificar uma imagem tão triste foi o objetivo de Guto: “É uma imagem que nos machuca, mas que não pode nos deixar só no luto. Precisamos que situações como estas nos deem força pra lutar e para que elas não se repitam”.
Com esse foco, o artista colocou o menino dentro de uma semente, de onde surge uma margarida. Para ele é a representatividade de um sonho, um mundo que seja de fato sem fronteira. “Um mundo onde todos tenham o direito de ir e vir, um mundo mais humano em que a gente seja, de fato, aberto para acolher o outro em suas necessidades e pluralidade”.
Outro elemento visível na arte é a terra, que quanto mais próxima à semente, mais clara fica. Para o criador, esse efeito reforça que a presença dos refugiados e dos migrantes é uma presença luminosa. “É uma presença que nos ajuda também a construir um jeito de ser. Quanto mais a gente se abre pra solidariedade e pra acolhida, mais luminoso a gente fica”, acredita.
Ao olhar para o painel de modo mais amplo, é possível identificar traços, próximos às flores, que resultam em seis personagens que, segundo o artista, visam representar um pouco das migrações históricas do Brasil, de ontem e de hoje. Estão sendo representados: os escravos por meio da escrava Anastácia, os migrantes europeus com a figura do italiano, os asiáticos e japoneses, os bolivianos, os africanos e haitianos e as mulheres sírias.
Tons azuis preenchem o fundo da obra. Basicamente uma mescla entre claro e escuro que o artista assimila ao horizonte, lembrando que nos dias atuais, as migrações ocorrem em sua maioria, principalmente na Europa, por meio de navios e os barcos. “Procurei me inspirar no momento em que ao olhar pro mar você não distingue o que é céu e terra, no caso, o que é céu e mar”, explica. Parafraseando o artista, o horizonte dá sentido que não existe separação de quem é de lá, e de quem é de cá. Entre quem migra e quem é do país pra onde essa pessoa migrou.
O último elemento a ser mencionado, mas não menos importante, é o mapa mundi, que está em vermelho para lembrar o sangue derramado de tantas vidas que já foram exterminadas. Do mapa saem setas que indicam os principais fluxos migratórios do mundo.
Ira Romão / Comunicação / CV2019